Chrono Trigger foi um daqueles jogos que na minha adolescência eu só tive contato através de revistas e que por anos eu sonhei em jogar, tendo finalmente a minha chance através de emuladores de Super Nintendo tempos depois. Apesar de na época o primeiro PlayStation e Nintendo 64 já serem um sucesso consolidado com seus títulos tridimensionais, aquele jogo de mecânicas simples e gráficos charmosos da geração anterior me prenderam tal como era prometido pelas revistas que o reverenciavam como um dos grandes clássicos do console.

Desde o meu primeiro contato com o jogo se passaram mais ou menos 19 anos, e apesar dele ter reservado o seu lugar quentinho no meu coração, outros títulos entraram no meu radar e ganharam o meu gosto também. Nesse meio tempo eu fui vendo aquela minha lembrança de aventura gostosa se tornar um monstro no meio da comunidade de jogadores. "Cadê a continuação?", "Melhor RPG de todos os tempos" e "Bom mesmo era Chrono Trigger, agora só tem lixo" foram algumas das coisas que eu ouvia e a preguiça gerada me tirava cada vez mais o brilho do título, ao ponto de eu chegar a questionar a sua grandiosidade. Só que recentemente eu entrei na pilha de jogar JRPGs e resolvi pegar a versão digital que está no meu Wii, que sinceramente eu não lembro de como foi parar lá, e usar toda a minha bagagem cultural adquirida nesses quase vinte anos para finalmente (re)descobrir o que afinal é Chrono Trigger.

Uma aventura da Sessão da Tarde

Não pense nisto de maneira pejorativa, pense nos filmes legais e nostálgicos que você guarda com carinho na memória até hoje, sei lá, pensa nos Goonies! A verdade é que o que torna Chrono Trigger esse jogo tão querido é o quão gostoso é acompanhar as aventuras de Crono e sua turma, todo o resto é acessório e pouco importa.

— Ah, mas e o sistema de batalha incrível? As Double Techs? E as TRIPLE TECHS!!!

Então, a verdade é que eu também lembrava do sistema de batalha de Chrono Trigger como algo super legal e diferenciado, mas em resumo é só um "espera barrinha encher, ataca, inimigo ataca, barrinha enche, navega pelo menu, solta magia, inimigo ataca, barrinha enche, ataque de dano em área, inimigo ataca, barrinha enche, inimigo é forte então navega mais uma vez pelo menu e junta dois ou três personagens para dar ataque mais forte, inimigo dá ataque forte também, barrinha enche, cura, usa item, ganha, sobe de nível, aprende mais magia, etc, etc, etc". É um sistema legal, mas não quebra nenhum paradigma e nem acrescenta em nada a aventura, é só a camada de desafio que intercala os trechos de história. Por sorte os inimigos não aparecem aleatoriamente, e salvo na parte final do jogo, a progressão é bem tranquila e sem maiores dificuldades. Aliás, esse jogo me pareceu muito mais fácil hoje em dia do que anos atrás. Mecânicas de cenário e mini games também estão espalhados pelo jogo sem muita pretensão e repetição desnecessária, tornando vários momentos únicos. O aprendizado e aplicação acontece na hora, sem tornar a mecânica maçante e repetitiva.

Mas é claro que a aventura não é essa coisa maravilhosa assim por motivo nenhum. Sim, tem todo o lance de "jogo feito pela equipe dos sonhos", Akira Toriyama e blá, blá, blá, mas não é bem isso. O que leva a história para frente não é nenhuma trama super elaborada, com momentos épicos e nem nada do gênero, mas sim o quão simples, despretensiosa e bem humorada ela é.

Chrono Trigger não é nada mais que a aventura de três adolescentes, Crono, Marle e Lucca, que vivem em um reino mágico de aspectos medievais e que por acidente acabam viajando no tempo. Por conta de suas ações atrapalhadas o grupo embarca em uma série de pequenas aventuras na tentativa de remediar a situação e ganham novos companheiros ao longo do caminho. Sim, eventualmente o jogo apresenta um vilão maior e eles decidem salvar o futuro do mundo, mas é uma decisão tomada de maneira inocente e juvenil, a realização da fantasia da criança de ser um herói. A grande preocupação é a de entreter o jogador e instigá-lo a seguir em frente, da forma mais direta, óbvia e linear possível, ao ponto das regras de viagem no tempo serem bem frouxas só para que as coisas fluam de maneira simples.

Claro que todo esse clima despretensioso não impede que a trama tenha os seus momentos marcantes e dramáticos. Ainda que simples, as histórias dos personagens são bem construídas e é possível apreciar o esmero dos desenvolvedores em cada detalhe do jogo. Como o título brinca muito com a questão da reação em cadeia das ações dos personagens em diferentes épocas, há várias pequenas ramificações na história, que embora não impeçam o jogador de apreciar a trama principal em sua totalidade, pode esconder pequenos momentos preciosos. Por exemplo, existe um diálogo entre os personagens Lucca e Robo que ao rejogar eu tomei para mim como o momento mais tocante de todo o jogo, mas que dependendo das escolhas de cada um pode não acontecer. Mas tudo bem, é sempre possível explorar outras possibilidades durante o "New Game+" enquanto se tenta fazer um dos famosos 13 finais.

Esse pacote todo de aventura e drama é brilhantemente embalado por uma trilha sonora inesquecível, com temas marcantes e precisos como nem sempre se ouve, onde a cada momento importante há alguma música tema para compor a situação, seja uma trilha melancólica ou épica. Até hoje a cena em que o personagem Frog se liberta de suas inseguranças e empunha a sua espada de maneira definitiva só tem o peso que tem para mim por conta da sua magnifica música tema.

A direção de arte também é belíssima, não somente pela influência do já citado Akira Toriyama na criação dos personagens, mas também pelos cenários, que muitas vezes parecem mais quadros do que cenas de um jogo, sendo aquele tipo de gráfico que por mais que a evolução dos consoles tenha alcançado patamares técnicos infinitamente superiores, não perde o seu espaço. Ainda sim os desenvolvedores não tiveram nenhuma vergonha em expor os limites técnicos do Super Nintendo. Em determinados momentos do jogo, por exemplo, uma névoa ou sombra que paira sobre cenário é simplesmente desabilitada durante uma animação visualmente mais elaborada de um ataque durante uma batalha, sem qualquer cerimônia.

Ainda que enquanto jogo Chrono Trigger seja um título curto para o padrão dos RPGs atuais, com um mapa pequeno e com poucos lugares, são esses elementos que permitem que a sua história se desenrole de maneira tão cativante e divertida. Mesmo que o seu trecho final acabe perdendo um pouco o foco com missões secundárias e longos corredores cheios de batalhas, ele com razão é um dos títulos mais memoráveis de todos os tempos, ainda que eu não compartilhe da paixão hiperbólica da maioria dos jogadores para com o título e nem enxergue a necessidade de uma continuação, uma vez que os bons momentos que tive com aqueles personagens me tenham sido preciosos justamente por serem únicos.

De todo modo foi bom relembrar o real motivo de eu ter gostado tanto desse jogo na primeira vez em que eu o joguei e ter mais uma boa lembrança dessa aventura que guardo novamente com tanto carinho em minhas memórias.