Fala kambada, beleza? Esse escrito de hoje é um pouco diferente do que vocês estão acostumados aqui. Não foi feito por nenhum de nossos colaboradores, e sim por um... leitor! Sim, o Willi Weiss me procurou, mostrou o seu texto e pediu para que fosse publicado aqui no site. Depois de rigorosos processos de avaliação e muito suborno em forma de cerveja, eu decidi que valia a pena atender o pedido do garoto... brincadeira, a parada está bem escrita mesmo e é uma excelente reflexão. Então, boa leitura!
---
Paisagens deslumbrantes, locais belos e vistas encantadoras arrancam suspiros de qualquer ser humano. Não importa a idade, a etnia, o sexo, a religião ou que for, quando nos encontramos em um lugar maravilhoso de observar, no qual olhamos para os lados e vislumbramos uma paisagem fantástica, suspiros de paz e conforto são arrancados de nós pela magia da vida. Seja uma paisagem urbana, desértica, florestal, não importa: nosso psicológico nos faz nos sentirmos bem quando estamos em um lugar gostoso de se apreciar visualmente.
Tal experiência, com o advento da tecnologia, pôde deixar de ser restrita às pessoas que se deslocavam a belos ambientes para apreciá-los. Com a invenção da fotografia, imagens podiam ser captadas e então guardadas para depois serem exibidas a outras pessoas. E com a chegada do cinema em 1895, tudo o que o ser humano desejasse registrar, não era mais limitado a uma imagem estática, mas a um conjunto de imagens que permitiam uma melhor observação do local por parte daqueles que não podiam se deslocar até lá.
O conceito de "vídeo" se popularizou junto com a venda dos aparelhos de videocassete em 1971 e nos anos seguintes. Tais aparelhos utilizavam como mídia uma versão aprimorada das fitas K-7 dos rádios, mas ao invés de gravarem somente áudio, o novo recipiente era capaz de reproduzir vídeo também, ambos em conjunto. As pessoas puderam, a partir de então, apreciar lindas paisagens e locais esplêndidos no conforto de sua casa, direto de seu televisor.
Não importa se é ao vivo ou por meio de uma tela, fato é que coisas "bonitas de se olhar" sempre fizeram e continuarão fazendo as pessoas se sentirem bem. Não vai ser o avanço da tecnologia ou mudanças de costumes sociais que mudarão isso. O bonito sempre será bonito, e é natural do ser humano e de seu psicológico, sentir-se bem e em paz quando diante de uma bela paisagem ou afim.
E nos nossos amados videogames isso também nunca foi diferente: em cada época, utilizando a tecnologia disponível, as produtoras de jogos sempre procuraram criar ou reproduzir lindíssimos ambientes em seus jogos, os quais, fosse no Nintendinho ou nos games modernos, sempre nos agradaram com sua beleza.
Mas o fato é que hoje em dia, a obsessão da grande maioria dos gamers em relação aos "gráficos" dos jogos têm saído do controle, ao ponto de algumas pessoas deixarem de jogar ótimos jogos por causa de seus gráficos ultrapassados. Ou mesmo de dizer que um jogo é ruim só por não ter gostado do gráfico, ignorando totalmente fatores cruciais em um jogo de videogame que são jogabilidade, diversão, nível de entretenimento e muitos outros.
Hoje é dia 24 de agosto de 2014, e neste texto, abordarei de forma geral as questões relacionadas a gráficos nos games atuais. Caso forem fazer julgamentos, utilizem de razão e não de preferência. Tenham todos uma ótima leitura.
Seja hoje ou na década de 80 com o Atari, os jogadores nunca aceitaram tudo e chamaram "qualquer coisa" de bonita. Tomando como exemplo os games dessa plataforma, para um jogador dos anos 80, Pitfall e River Raid são uma obra prima em matéria de gráficos se comparados a ET ou Carnival. Sempre foi assim com todas as plataformas e sempre vai ser, sempre vão haver os games bonitos e os games feios. Mas um fator que temos de considerar é que, com o passar dos anos e o avanço da tecnologia, há cada vez mais games bonitos e cada vez menos games feios. Os jogos que antes custavam algumas centenas de dólares para serem produzidos em 8 semanas, hoje custam milhões e levam anos para serem lançados. As empresas aprenderam como se faz, e todas se esforçam para caprichar na beleza de seus games. E, em contrapartida, numa época em que nunca se viram jogos tão lindos e realistas como hoje em dia, também nunca se viu tantos gamers estressados e enjoados, dizendo que os jogos estão feios. Curioso isso, não?
Pois é. Na minha opinião, um dos maiores erros foi de as empresas deixarem o conhecimento técnico chegar aos olhos e ouvidos dos jogadores. Eles aprenderam o que são texturas, o que é shadding, o que é renderização, o que é suavização, o que são frames por segundo, o que é resolução e todas essas coisas que acabaram nos tornando céticos demais. Se antes achávamos algo bonito "porque era bonito", hoje fazemos uma análise técnica dos gráficos do jogo antes de lhe conceder algum adjetivo. E isso é bom, certo? Assim podemos exigir das empresas um produto melhor e elas estarão sempre nos entregando games com gráficos cada vez mais estonteantes, e isso será ótimo para nós, não é? Irei te responder a essa pergunta de uma maneira detalhada, destrinchada e bem específica no parágrafo abaixo.
Não.
E eu vou provar isso a vocês.
Você gamer que está lendo este texto. Quantas vezes você já não parou num game de mundo aberto que possui vislumbres para todos os lados, e deixou de notar a beleza de um gramado com um lago cercado de belas árvores com folhas caindo, para reparar que a grama estava quadrada? Quantas vezes você não deixou escapar um pedaço de uma cutscene para reparar que ela estava sem VSync? Quantas vezes você foi atingido pelos inimigos em uma correria porque estava mais preocupado com a quantia de frames por segundo que o jogo tem em sua plataforma em relação à plataforma do seu amigo, ao invés de se preocupar em encontrar um abrigo para o seu personagem? Quantas vezes você não deixou de se reunir com sua turma para jogar um saudável e gostoso multiplayer de tela dividida porque nessa condição o jogo perde 10 frames? Quanto tempo da sua vida em que você poderia estar pesquisando ou lendo sobre algo interessante na internet que podia servir para que você tirasse uma nota melhor na prova ou tivesse mais assunto para conversar com a moça/rapaz da/do qual você gosta, você desperdiçou para assistir a vídeos de comparações gráficas entre plataformas e ficar numa angústia interna de que a sua plataforma tem o desempenho inferior àquela outra do vídeo?
É isso aí.
Falo por experiência própria. Vou contar uma verdade da minha vida pra você agora. Aprendi (e me arrependo profunda e amargamente) sobre texturas, renderização e etc, este ano. Na busca por decidir qual plataforma eu escolheria para essa próxima geração (PlayStation 4, Xbox One, Wii U ou PC), decidi dar uma chance ao PC, que é uma plataforma pela qual não tenho muita simpatia para jogar. Como no PC você tem que escolher peça por peça, comecei a ver vídeos e ler textos ensinando a escolher as peças certas, o desempenho de cada uma, etc. Me aprofundei muito nas placas de vídeo, e nisso, devorei o canal da ChipArt Informática no Youtube. Lá, há reviews detalhadíssimos de todas as placas de vídeo que você pode imaginar. E junto disso, eles lhe transmitem bastante conhecimento sobre esses detalhes técnicos nos jogos. E quando você aprende, você começa a reparar neles quando vai jogar.
Até então, meu PlayStation 3 era o céu na Terra. A grande maioria dos games que eu jogava, achava um vislumbre. Depois de aprender sobre os detalhes técnicos, comecei a prestar atenção demais nisso e achar feios os jogos que antes eu achava lindos. Mas não por eles realmente serem feios e agora eu "manjar das coisas", pelo contrário: eles são lindos, mas eu me tornei cético demais. É como expliquei lá em cima, há jogos bonitos e há jogos feios, e você acha algo bonito "porque é bonito" ou feio "porque é feio". Mas quando você aprende sobre essas coisas, fica tão crítico que deixa de reparar na beleza para identificar defeitos. E agora estou correndo atrás do prejuízo, tentando me auto educar para voltar a prestar mais atenção no que importa - o jogo - como eu fazia antes e esquecer esse conhecimento técnico. É difícil.
Só que diferente de mim, muitos gamers que também adquiriram esse conhecimento, se esqueceram das outras coisas que importam num jogo, e hoje estão se preocupando exclusivamente com gráficos e deixando todos os demais fatores de lado. Na batalha PC x Consoles, eu compreendo alguns gamers defenderem o PC por preferirem o mouse e o teclado para jogar e poderem sentar mais perto da tela, como compreendo outros que preferem o console por gostarem mais do sofá e do controle. Também compreendo a galera dos computadores preferirem a plataforma por gostar mais de jogar online, e o pessoal dos videogames defenderem estes pois preferem jogar com os amigos (embora ambas as possibilidades estejam disponíveis em ambas as plataformas). Só que tem a galera que está esquecendo tudo e deixando tudo de lado, e optando pelo PC só por causa dos gráficos melhores e taxa de quadros por segundo mais altas. Eu não gosto de jogar no PC, mas não tenho nada contra quem goste e respeito isso, pois na minha vida aprendi a respeitar os gostos dos outros. Então não ache que meu argumento é este por eu não ter apreço pela plataforma, mas é algo que observei, os gamers ignorando os fatores gerais que constituem o seu gosto para dar atenção unicamente aos gráficos. Minha preocupação não tem nada a ver com "todos irem pro PC e os consoles acabarem", nada disso. Me preocupo é com a alienação que o pessoal está tendo com os gráficos, numa época em que os jogos nunca foram tão bonitos.
Essa alienação, que muitos julgam ser boa para a indústria dos videogames, pois fará as empresas lançarem jogos com gráficos cada vez melhores, na verdade é negativa, pois acarretará numa igual preocupação extrema das empresas com os gráficos, diminuindo a importância dada por elas para fatores como jogabilidade, desafio, inovação, etc. Esta última, inclusive, foi deixada quase que totalmente de lado com a chegada da nova geração de consoles, ao ponto de as empresas, enquanto nos anúncios de suas novas plataformas, darem destaque à resolução que os jogos terão nos novos consoles ao invés das novas possibilidades de jogo que eles oferecem. Sim, agora você interage com o game falando com o Kinect, usando o touch do Dual Shock 4 ou então a segunda tela do Wii U, mas isso quase não teve importância se comparado ao "auê" dos novos gráficos que essa geração irá nos trazer, que pra falar a verdade, por enquanto, são praticamente a mesma coisa. Um amigo meu comprou um Xbox One, fomos jogar Watch Dogs nele e, falando sério, é a mesma coisa do PS3 só que um pouco mais nítida e com VSync (a versão do game para os consoles de 7ª geração não apresenta o recurso). E se você for olhar para trás, verá que nas gerações passadas, o "auê" para os novos gráficos que elas trariam também foi grande (afinal nós gamers sempre queremos jogos mais bonitos), mas foi tão grande quanto as possibilidades do controle de três cabos do Nintendo 64, tão grande quanto o surgimento do Dual Shock para o PlayStation, tão grande quanto o deslocamento rápido pela tela que o Mega Drive era capaz de aguentar com o Sonic, tão grande quanto tudo isso, não mais que isso. E hoje é o oposto.
Muitos podem alegar o contrário, mas o fato é que a indústria dá aos jogadores o que eles pedem. Sempre deu. Afinal não dá-los o que pedem poderia levá-las a possíveis falências, e falir é a última coisa que elas querem. Então elas fazem o que pedimos. Existe Satoru Iwata, existe Satya Nadella, existe Kazuo Hirai, mas quem manda nas empresas de games de verdade, somos nós, gamers. Pense comigo, quem assiste à Globo à noite quer ver o quê? Novelas. Então a Globo exibe novelas. Os telespectadores assistem, gostam, e pedem por mais novelas. A Globo dá mais novelas. Agora, a Globo experimenta exibir uma cena de sexo em suas novelas. Quem acompanha as novelas, gosta da cena. Nas novelas seguintes há mais que uma cena de sexo, os espectadores gostam, pedem mais e a Globo vai dando. Assim que a bola de neve cresce. Com os games é a mesma coisa. Sutilmente, as produtoras tentam nos hipnotizar com belíssimos gráficos, gostamos e pedimos por mais. E elas nos dão mais games com belíssimos gráficos. Nós gostamos e queremos mais, e assim sucessivamente. Mas eu insisto em acreditar que nós gamers não somos tão burros como quem assiste às novelas da Globo, e portanto, somos perfeitamente capazes de exigir muito mais que apenas gráficos bonitos, e de sermos tão críticos para jogabilidade, enredo, diversão e o que pode melhorar nos jogos no geral, como somos para gráficos.
Não me interprete mal, pois não quero, de maneira nenhuma, dizer que não devemos nos importar com gráficos. Inclusive, considero a tal frase "Se quer gráficos realistas, olhe pela janela" uma completa bobagem. Se não nos importássemos com gráficos, estaríamos jogando games de 8 bits ainda hoje. Não tem nada de errado em exigir jogos cada vez mais bonitos. O que não podemos é exigir só isso e nos esquecermos de todo o resto, afinal, estamos falando de videogames, e não de filmes feitos em computação gráfica.
Originalmente publicado em Fórum The Triforce Alliance - Woooow! Nice graphics!.
Compartilhe