Análise de Assassin’s Creed: Rogue - Shay era um Assassino que abandonou a Irmandade e decidiu agir sob a ideologia templária. Mas isso realmente faz dele uma pessoa ruim?
Shay era um Assassino que abandonou a Irmandade e decidiu agir sob a ideologia templária. Mas isso realmente faz dele uma pessoa ruim?
Da última vez que escrevi sobre Assassin’s Creed, eu fiz questão de deixar claro que ela era minha franquia favorita. Uma outra verdade é que essa opinião mudou quando joguei Mass Effect, mas ele não foi o único motivo. Apesar de ainda ser um jogo muito bonito e com apelo muito grande para mim devido aos contextos históricos em que se inserem, o fato de a Ubisoft lançar tantos jogos um após o outro sem o devido polimento e com enredos cada vez menos associados aos motivos de cada grupo - Assassinos e Templários - me fez perder um pouco a graça pelo jogo. Ainda assim, não posso dizer que desgostei da franquia. De fato, eu ainda me divirto muito com ela, apenas não me sinto tão compelida a comprar os jogos novos (pelo menos, não no lançamento).
Foi bem isso o que eu senti quando a Ubisoft resolveu lançar nada menos que DOIS Assassin’s Creed no mesmo ano: Unity e Rogue, para a new gen e não-tão-old gen, respectivamente, numa tentativa de alavancar ainda mais seus lucros, já que *abre sarcasmo* duas gerações em alta pedem dois jogos diferentes, não é mesmo? *fecha sarcasmo* O fato é que eu simplesmente não me empolguei com os jogos ou, pelo menos, não com o Unity que, mesmo sendo todo bonitão, apelava com o sentimento de nostalgia por AC1 e pela semelhança absurda de Arno e Ezio, o que só me leva a pensar que a Ubi seja muito preguiçosa, algo que pode ser confirmado com a afirmação deles de que não fazem personagens femininas porque são "o dobro de trabalho de produção".
Mas, ao contrário do que senti com os detalhes de Unity, fiquei legitimamente interessada em Rogue: um jogo que me daria a oportunidade de jogar com um Templário e, quem sabe, entender um pouco mais das motivações e da realidade deles. Além disso, o personagem seria um ex-Assassino... O que será que aconteceu? Convenhamos, depois de muitos jogos protagonizados por Assassinos e um protagonizado por um pirata (que nem sequer entrou para a Irmandade durante o jogo), jogar como um Templário seria, no mínimo, curioso.
Bom, finalmente pude colocar minhas mãos no Rogue. Comprei de um amigo que passava por dificuldades financeiras e, infelizmente, teve que vender seu PS3 e seus jogos. Felizmente, para mim foi a melhor oportunidade, já que nas lojas o preço ainda não era nada convidativo.
Assassin’s Creed: Rogue se passa entre os anos de 1752 e 1761, durante a Guerra dos Sete Anos, mais precisamente durante o Conflito Franco-Indígena, que foi o conflito entre britânicos e franceses pelo controle comercial e marítimo das colônias norte-americanas. Nesse cenário, você controla Shay Patrick Cormac, um jovem de 24 anos recém-recrutado para a Irmandade dos Assassinos, que apoia a causa francesa. Já os Templários lutam pela causa britânica. Relembrando um pouco a história e fazendo uma conexão entre os jogos, a vitória britânica aliada aos altos gastos com a guerra, fez com que fosse necessário um aumento de tributos nas colônias norte-americanas, o que levou à grande insatisfação e desejo de independência por parte dos colonos, o que dá início às guerras de independência americana e, assim, a Assassin’s Creed III.
Ou seja, se você jogou ACIII e ficou confuso com o contexto do jogo, sem saber quem era Achilles no jogo do bicho, porque ele mancava, porque ele estava "aposentado" e porque a Irmandade estava praticamente falida, AC: Rogue é o seu jogo! Além disso, se em Black Flag você tinha os Navios Épicos para enfrentar, em Rogue você tem as batalhas épicas, onde você pode enfrentar até mesmo frotas em vez de um único navio, algumas delas baseadas em batalhas reais, como a Batalha de Labrador (na época chamado de Nova França, juntamente com Quebec e Ontário) e a Batalha de Quiberon Bay.
As mecânicas de AC: Rogue são exatamente as mesmas de Black Flag. As batalhas navais continuam presentes e, em certos aspectos, estão até melhores que em Black Flag, pois agora o seu navio pode ser abordado por navios inimigos, visto que no anterior apenas você podia fazer isso. Há também duas novidades nos upgrades que você pode fazer no seu navio: barris de óleo escaldante (burning oil) que pode ser jogado no mar para evitar perseguições por outros navios; e o quebra-gelo (ice ram), que te permite explorar novos locais no mapa. As missões submarinas que existiam em Black Flag foram eliminadas, o que faz muito sentido, já que o jogo se passa no Atlântico Norte e as águas são congelantes!
A trilha sonora do jogo é muito boa, apesar de não ser nada tão fenomenal. É pontual e cai bem nas situações, com exceção da música de menu que é épica. Durante a navegação, você continua com a opção de deixar seus marujos cantarem, mas Rogue tem uma variedade bem maior de músicas do que Black Flag. Os mapas abrangem o Atlântico Norte, Nova Iorque e River Valley, com muitos lugares para visitar. No entanto, a campanha principal do jogo é relativamente curta se comparada com os demais, possuindo apenas 6 sequências de memórias (contra 12 de Black Flag, em comparação). Então, se você não quiser pegar colecionáveis e roupas extras para Shay, não deve chegar a explorar nem metade dos locais disponíveis nos mapas.
Bom, e se AC: Rogue tem tudo praticamente igual a Black Flag, então o que faz a diferença? Bem, meus amigos, o grande diferencial é o Shay.
A história de Shay em AC: Rogue pode ser dividida em três partes principais. Nas primeiras memórias, Shay é um cara jovem e ainda em treinamento na Irmandade dos Assassinos, sempre sendo enviado em missões com o acompanhamento de um Assassino mais experiente e amigo pessoal, Liam. Algo que fica bem perceptível durante o gameplay dessa fase é que Shay está sempre na expectativa de saber mais sobre os Assassinos e sua luta contra os Templários, mas nunca tem total transparência nas respostas que recebe. Em alguns momentos, você percebe no rosto de Shay o seu descontentamento com essa situação, mas ele evita questionar cada vez mais porque acredita que está do lado certo da guerra, que está fazendo o bem. E é nessa vibe que Shay é enviado pela primeira vez a uma missão dos Assassinos em Lisboa para resgatar um artefato da Primeira Civilização, uma missão que acaba em tragédia e na morte de milhares de pessoas. Algo semelhante já havia ocorrido no Haiti, durante eventos da DLC Freedom Cry.
Abalado com os acontecimentos, Shay percebe que a posse de tal artefato não pode trazer bem a ninguém e que o mesmo deve ficar isolado e ser protegido para que ninguém mais tenha acesso e para que nenhuma tragédia ocorra, mas os Assassinos (motivados por seu mestre, Achilles) estão tão obcecados pelo artefato que não dão ouvidos aos avisos de Shay. No desespero de evitar que os Assassinos encontrem outro artefato e causem mais destruição, Shay decide tentar roubar e destruir os mapas que podem ajudar os Assassinos a encontrar tais artefatos, mas é impedido por seu mestre, que o declara um traidor e coloca um prêmio por sua captura. No processo de fuga, os Assassinos acabam acreditando que Shay possa ter morrido e o esquecem. Os mapas da localização do artefato estão seguros. Por ora.
Assim, temos a segunda parte da história de Shay quando, depois de recuperado, ele resolve ajudar o casal de idosos que o resgatou, descobrindo assim que as pessoas que perseguem seus amigos são criminosos que estão dominando certas áreas de Nova Iorque. Para sua surpresa, esses "criminosos" são agentes Assassinos espalhados por vários lugares do continente. Para quem sempre jogou a franquia e sempre viu os Assassinos como heróis, chega a ser chocante vê-los agindo como bandidos, assediando pessoas inocentes por posses e por certas vantagens, quando o objetivo deles deveria ser o de protegê-los. Em Rogue, os Assassinos não medem esforços para conseguir o que querem, mesmo que isso signifique que alguns inocentes tenham que pagar com suas vidas. E assim, Shay decide unir o útil ao agradável, já que não tem para onde ir e o que fazer de sua vida, ele resolve ajudar os agentes templários a impedir que os assassinos consigam os artefatos, mesmo não se filiando a Ordem dos Templários.
Como Otso Berg diz em certa parte do jogo, tanto Assassinos como Templários tem um objetivo em comum: a paz. Mas os Assassinos querem alcançar a paz através de algo bem mais perigoso, a liberdade. Os Templários, por outro lado, procuram a paz através da ordem. Agora, se a gente parar para pensar no lema dos Assassinos quando eles dizem que "Onde outros homens estejam limitados pela moral ou pela lei, lembrem-se: tudo é permitido" e considerarmos que, um dia, os Assassinos consigam a liberdade sonhada pela civilização sob esse lema, as chances de que o caos se instaure são bem maiores do que possamos imaginar. Dá até medo de tentar imaginar um mundo onde você não tenha limite moral ou legal para suas ações. Até jogar AC: Rogue, eu nunca tinha parado para pensar dessa forma, para um dia me questionar se os Assassinos realmente são os heróis dessa história toda. E mesmo que suas intenções sejam as melhores, estariam os Assassinos agindo da forma mais inteligente para alcançar a tão sonhada paz? E é movido por estes questionamentos e pelo sentimento de urgência em impedir os assassinos, bem como pelo sentimento de vingança, que Shay se torna oficialmente um Templário, iniciando o que eu chamo de terceira fase de sua vida.
A Ubisoft conseguiu me fazer repensar em tudo que eu já tinha feito nos AC anteriores e me fez ter vontade de rejogar todos os outros jogos de forma que eu analise com calma tudo que é dito e feito. E se os Templários tivessem feito coisas realmente boas e extraordinárias que passaram despercebidas porque sempre pensamos neles como "os caras maus"?
Mas, calma aí, você que odeia os Templários do fundo do coração e acha que eu virei casaca. Não é bem assim. O que devemos entender é que AC: Rogue não traz nenhuma verdade definitiva sobre nenhum dos lados. O que Rogue realmente nos mostra é que, não importa quem é o bom e quem é o ruim, o que importa é que decisões erradas e precipitadas podem ter consequências desastrosas e a longo prazo, e que ninguém é 100% certo ou errado o tempo inteiro, o ser humano pode errar, e pode errar feio. Por mais que os Assassinos tivessem boas intenções ao tentar encontrar os artefatos da Primeira Civilização, Achilles não teve tato ao tratar do assunto e avaliar as consequências. E seria muito ingênuo de nossa parte acreditar que uma organização tão antiga quanto a dos Assassinos tenha sempre alcançado sucesso em sua empreitada. Infelizmente, o próprio Achilles percebeu que Shay estava certo o tempo todo. Porém, era tarde demais. E a Irmandade dos Assassinos sofreu as consequências, perdendo seus aliados e sendo quase extinta. A culpa da queda dos Assassinos não é culpa de mais ninguém além de Achilles.
A adesão de Shay aos Templários não deve ser considerada um ato de traição, pois ele só fez o que sua razão julgava ser o melhor para a humanidade, mesmo que isso resultasse na sua própria ruína. Na minha opinião, Shay foi um dos personagens mais fortes que a Ubisoft já criou para a franquia, sendo uma pessoa de muita moral e determinação para seguir com o que acredita ser o melhor para os mais necessitados, com sensibilidade a um nível que eu, talvez, não tenha visto em nenhum dos outros Assassinos. Agora, se isso irá mudar no decorrer da vida dele, só o tempo vai dizer.
O final do jogo só pode ser definido como ÉPICO e inesperado e é um link direto a AC: Unity. Se você acompanha a saga dos Assassinos e Templários, AC: Rogue é uma peça fundamental no quebra-cabeça da história da franquia, unindo o prazer da jogabilidade de Black Flag com as nostálgicas disputas e conspirações entre Assassinos e Templários, que desde a saga de Ezio não recebiam a devida atenção. Rogue é um excelente jogo que, infelizmente e injustamente, foi ofuscado pelo lançamento simultâneo com Unity e, se querem mesmo minha sugestão, peguem seus capuzes e hidden blades e Vão Jogar!
Rogue dá ao jogador a oportunidade de ver o outro lado da moeda enquanto controla um Templário em vez de um Assassino. O enredo é coerente e bem escrito com um final marcante e elo direto a Unity e, aliado aos pontos fortes da jogabilidade de seu antecessor, faz Rogue ser um dos melhores títulos da franquia para PS3. No entanto, a curta duração do jogo em relação aos demais deixou um gostinho de "quero mais". Avaliado noPlayStation 3 (entenda o nosso sistema de notas)
Excelente análise, sucodelarAngela! Acho esse um dos melhores AC na abordagem do tema ordem x caos, e como você disse, não teve a devida atenção por causa do Unity. A ideia de ver o outro lado, e perceber que não existem certo e errado absoluto, que até os mais bem intencionados erram foi muito bem construida. Sem falar que encarar adversários usando técnicas iguais às suas foi muito bom hehe
Bacana a análise, Mas de Assassins Creed parei no segundo jogo. Não duvido da qualidade do Rogue (que dizem ser melhor que o Unity e por ter menos bugs) mas eu não o compraria.... só se pintar uma promoção e olhe lá.
E ainda aguardo um AC que se passe na primeira guerra mundial.
Obrigada, moço! Muito bem lembrado de sua parte, somos perseguidos constantemente por outros Assassinos durante o jogo, e confesso que é até complicado não ser pego de surpresa por alguns deles de vez em quando. Mais um ponto positivo para Rogue!
@Leon Belmont
Eu cheguei a jogar um pouco do Unity e, apesar de ser um jogo de visual superior aos demais, achei um pouco sem graça. A mudança de controles e, principalmente, dos combates também foi o ponto negativo ao meu ver. Quanto a AC’s na I Guerra Mundial, não tenho muita certeza se a Ubisoft vai chegar a produzir algo do tipo. Confesso que prefiro que não tenha, pois acho que ficaria muito Call of Duty, algo que não curto. A própria Ubi já anunciou que não teria jogo ambientado nessa época por causa da Highway Hypnosis, o que faz muito sentido, já que se trata de algo que afeta a memória (e o jogo é baseado em memórias)... No entanto, temos pequenas cenas na II Guerra Mundial durante o gameplay de Unity, então, sabe-se lá que diabos a Ubi planeja, né?
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