Tudo bem, a série não deixa de ser um grande merchandising do jogo e até mesmo um pouco do PlayStation 4, mas foi tranquilizador assistir aos episódios, com pouco mais de vinte minutos de duração cada, sem nenhuma menção desnecessária ao título ou ao console da Sony. De fato, na maior parte do tempo eles se referem ao jogo simplesmente por Final Fantasy e nada mais.
A história em si também não tem nada de espetacular, muitas vezes lembrando mais um anime e todas as suas caricaturas, porém com atores reais e algumas sequencias feitas com os acontecimentos dentro do jogo, onde os diálogos digitados foram substituídos por dublagens com as vozes dos personagens. Porém eu acredito que ela vá pegar alguns jogadores pelo fator nostálgico, já que por diversos momentos Akio relembra sua infância, em que ele compartilhava bons momentos jogando Final Fantasy III no Famicom com seu pai, o que pode gerar uma certa identificação. Infelizmente para o personagem, a relação entre os dois ficou distante com o tempo, culminando em seu plano mirabolante de se relacionar novamente com o seu pai através do jogo online, após uma inesperada aposentadoria. Apesar de bem óbvia, a trama foi singela o suficiente para me gerar empatia pelos personagens e seus dramas.
Mas talvez o que mais me gerou interesse em Dad of Light foi algo não intencional da trama, e que provavelmente faça mais sentido para os ocidentais, que foi poder observar algumas facetas da cultura japonesa ali expostas. Não que a série mostre algo muito surpreendente ou inusitado, e tão pouco se foque em coisas da cultura pop, como seria de se esperar em uma série que tem como catalizador um jogo de videogame, mas é sempre intrigante ver a forma estranha como as pessoas se relacionam na cultura em questão.
Claro que como eu disse antes, tudo ali é meio caricato e elevado ao extremo, mas dado o que eu já li e ouvi sobre o tema, parece bater muito com a realidade daquele povo, que é povoada de antagonismos estranhos, onde ao mesmo tempo em que há um machismo aparente e normalizado na sociedade, com assédios bizarros infelizmente sendo comuns, existe também um respeito verdadeiro e profundo entre homem e mulher dentro de uma relação matrimonial, ainda que o papel dela seja limitado ao de dona de casa. Espere também ver outros aspectos sendo mostrados, como a relação com o trabalho e a forma extrema com que isso é encarado por algumas pessoas. Ainda que boa parte desses aspectos culturais não sejam nem um pouco desejáveis, não deixa de ser interessante observá-los.
Ainda que boa parte desses aspectos culturais não sejam nem um pouco desejáveis, não deixa de ser interessante observá-los.
Mas claro que como era de se esperar, o que acaba sendo mais explorado é a questão da relação entre pai e filho, e como se deu o distanciamento entre os dois, sem que algum acontecimento em especial tenha sido decisivo para isso. Nesse aspecto eu não vejo tantas diferenças entre culturas assim, uma vez que não é incomum, em especial para nós homens, termos dificuldades nos diversos relacionamentos em nossas vidas pela simples inabilidade em lidar com os nossos sentimentos, principalmente em ambientes familiares. Na história Akio precisou de recorrer a um artifício para que Inaba se sentisse seguro em um meio separado de sua vida real, para então conseguir ter conversas sinceras e finalmente entender quem realmente era o seu pai, e claro, no processo entender mais sobre ele mesmo.
Um ponto também que me chamou muito a atenção é como a relação de pessoas que tem pouco contato com jogos atuais é totalmente diferente de outras que, como muitos de nós, estão acostumadas a todo tipo de jogo. Akio em diversos momentos tem que se esforçar para que Inaba não desista de jogar por conta das dificuldades iniciais que o jogo impõe, ainda que ele estivesse gostando muito do título, o que de um certo modo acaba apontando até mesmo uma falha de design na jogabilidade. As nuances de um jogo online também geram situações engraçadas pela falta de experiência de Inaba, além de simples divergências conceituais entre os dois, como na hora da escolha do nome do personagem.
No final das contas, o que eu considero o grande mérito da série é justamente o de conseguir conduzir toda essa trama familiar utilizando um jogo como parte da narrativa. Claro que você verá batalhas e alguns conceitos básicos sendo mostrados, mas nada soa como um gameplay de YouTube, pois há realmente uma história pessoal acontecendo por trás de tudo aquilo. Aliás, a história não foi inventada, e é baseada nos relatos do jogador Ichigeki Kakusatsu SS Nikki, que foram publicados em uma série de textos intitulados Hikari no Otōsan. Há também um episódio especial final que é um pouco mais focado no jogo em si, mas que também passa por um outro relato paralelo a trama.
Dad of Light não será a série mais incrível que você irá assistir, mas com certeza é algo que eu recomendo às pessoas, jogadoras ou não, por seu teor dramático leve e exposição sincera de aspectos de uma cultura um tanto diferente da nossa, girando em torno de algo tão comum para nós como jogos de videogame.
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